domingo, 15 de novembro de 2009

A viagem poética de Euclides


Reunião inédita de 133 trabalhos apresenta visão de conjunto da produção em versos do escritor

Integrado aos eventos que lembram, em 2009, os cem anos da morte de um dos maiores escritores brasileiros, a Editora Unesp lançou, em 15 de outubro, na Feira do Livro de Frankfurt, Alemanha, o livro Euclides da Cunha: poesia reunida. A edição comemorativa oferece pela primeira vez uma visão de conjunto do acervo poético do autor de Os sertões, grande parte inédito.

Organizado por Leopoldo M. Bernucci, professor de Literatura Latino-Americana da Universidade da Califórnia, e Francisco Foot Hardman, da Unicamp, o volume mostra como a poesia de Euclides apresenta repúdio à escravidão negra, utopia revolucionária republicana, metafísica do eu, angústia da vida humana desgarrada da religião, desejo de morte e de glória, panteísmo e anticlericalismo.

Também se caracteriza por denúncia da miséria social, militância antimonarquista, patriotismo acentuado, desejo de representar os principais momentos da história geral e nacional, amor à natureza, elogio da vida no campo e repulsa à cidade.

Antologia de Bandeira – Dois textos, “Mundos extintos” e “Se acaso uma alma se fotografasse”, foram escolhidos, em 1946, por Manuel Bandeira para integrar a sua Antologia de poetas bissextos brasileiros contemporâneos. Mas, geralmente, a poesia de Euclides saiu esparsamente, antes e depois da morte do seu autor, em publicações hoje de difícil acesso ou manuseio, mal citada, defeituosamente transcrita e editada.

A presente edição traz 133 poemas, sendo 78 pertencentes ao caderno manuscrito Ondas; 20 poemas dispersos e 12 postais, além de 15 variantes principais e oito secundárias. Até agora, a maior reunião de poemas de Euclides não atingia os 40 textos.

A obra cobre quase trinta anos da vida do autor (1883-1909). Há sonetos, odes, versos heroicos, épicos, dramáticos, líricos e versos rimados ou brancos escritos em cartões, bilhetes postais ou em retratos dele próprio.

O caderno Ondas (1883/84) traz também 13 notas do próprio poeta, 12 em folhas separadas e uma de rodapé para um único poema, “No túmulo de um inglês...”. Geralmente, cada poema traz a data de composição e a assinatura do autor, que oscila entre Euclydes, Euclydes da Cunha e Euclydes Cunha.

Em postais – Os poemas reunidos como Dispersos (1885/1909) trazem pelo menos quatro inéditos em livros, além de dois jamais publicados sob nenhuma forma impressa. Em Poesia postal (1902/1906), estão textos rascunhados em cadernos ou em folhas avulsas manuscritas – não se sabendo ao certo se foram expedidos – em blue prints, técnica de reprodução fotográfica muito em voga na época, cartões ou bilhetes postais.

Destacam-se os postais coloridos sobre a viagem de Euclides à Amazônia. Escritos entre dezembro de 1904 e fevereiro de 1905, são endereçados para vários amigos. Do mencionado soneto “Se acaso uma alma se fotografasse”, Bernucci e Hardman levantaram quatro diferentes variantes.

Elas foram enviadas a distintos destinatários, fazendo supor que esse número tenha sido ainda maior, pois Euclides se dedicou a manuscrevê-lo, alterando-o, sempre sobre as mesmas reproduções de uma fotografia do grupo expedicionário ao Alto Purus.

O volume é de grande importância por motivar uma melhor análise da complexa transição do romantismo ao modernismo no Brasil, entre as duas últimas décadas do século XIX e a primeira década do século XX. Propicia também uma visão mais completa de Os sertões, um dos mais importantes livros da literatura nacional.

Oscar D’Ambrosio

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