quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Emoção, coerência e seriedade, marcas do seminário

Em Cantagalo, 'Seminário Internacional 100 anos sem Euclides' reafirma o sentimento de patriotismo pela união de interesses em torno da obra euclidiana

por Álvaro Ribeiro Neto*

Durante três dias, a partir de 25 de setembro, a cidade de Cantagalo comemorou o centenário da morte de Euclides da Cunha. O projeto tem o sugestivo nome de “100 anos sem Euclides” e foi organizado pelos professores Anabelle Loivos Considera Conde Sangenis e Luiz Fernando Conde Sangenis. Participaram professores e estudantes de vários estados brasileiros e Leopoldo Bernucci, brasileiro radicado na Califórnia, USA e Berthold Zilly, da Universidade de Berlim, Alemanha, deram o toque internacional ao evento. O caráter nacional ficou por conta de participantes dos estados do Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Acre, Paraíba, Bahia, Pará, Ceará, Maranhão.


Criteriosamente organizado, o Seminário dividiu suas atividades em Programações Acadêmicas e Culturais apresentadas, respectivamente, no Hotel Fazenda Pesqueiro da Aldeia onde estudantes e parte dos professores ficaram hospedados e no centro da cidade de Cantagalo com apresentações de filmes relacionados ao tema, de orquestra sinfônica e outros grupos. A abertura coube ao professor Leopoldo Bernucci e o encerramento ao tradutor de Os Sertões, o alemão Berthold Zilly. Além de assuntos relacionados especificamente aos estudos do pensamento euclidiano, outros temas, como a literatura de cordel, tiveram seus representantes. Intelectuais ilustres como o presidente da Academia Brasileira de Letras, Cícero Sandroni, e o escritor e poeta Ariano Suassuna, por exemplo, prestigiaram o congresso. Ariano Suassuna, responsável pela conferência oficial, magnetizou a plateia com sua legitimidade, sua erudição, sua simplicidade, seu carisma, seu ideal de construir através de suas ações como escritor ou Secretário da Cultura de Pernambuco, um Brasil melhor para os brasileiros.

Os nomes de Oswaldo Galotti e de São José do Rio Pardo como precursores do movimento euclidiano, vez por outra foram lembrados durante as comunicações de professores veteranos ou jovens. O Instituto Cultural Oswaldo Galotti, gentilmente convidado pelos organizadores, foi um dos proponentes do Seminário. Um fato interessante: Cícero Sandroni disse que já esteve em São José do Rio Pardo para participar de Semanas Euclidianas. Diante disso procurei-o e ele me falou que conhecia Oswaldo Galotti e ficava hospedado na casa de seu tio Luiz Romano nos anos de 1952/53. Bons tempos esses, da Semana Euclidiana em São José do Rio Pardo...

Fizeram parte das atividades acadêmicas, as Sessões de Comunicações Coordenadas em que um(a) mediador(a) coordenava debates de temas relacionados ao pensamento euclidiano nos seus múltiplos aspectos. A maioria dos pronunciamentos se ocupou com “Os Sertões” e a viagem de Euclides da Cunha ao Amazonas. Estudos atualizados e profundos sobre essas questões foram expostos e debatidos. Em quiosques do magnífico Hotel Fazenda, exposições sobre personalidades da Cantagalo, sobre a atuação de professores locais no ensino do euclidianismo a estudantes do ensino fundamental e médio das escolas públicas. A participação de uma adolescente antes da conferência oficial de Ariano Suassuna contando a biografia de Euclides da Cunha emocionou quem estava participando do evento. Aquela exposição, deixou clara a seriedade da proposta que prepara a juventude cantagalense para entender a vida e obra do escritor conterrâneo.

Outro ponto que considerei importante para a retidão que cercou o Seminário Internacional sobre os 100 anos sem Euclides da Cunha foi a emoção incontida de dois palestrantes ilustres quando se aproximaram mais do autor de Os Sertões em suas falas: Cícero Sandroni ao ler para atentos participantes o texto “A última visita” em que Euclides fala sobre a presença de um adolescente ao leito de morte de Machado de Assis, não conseguiu segurar as lágrimas e quase não acabou o discurso. Em outro momento, Ariano Suassuna, ao responder a um de seus interlocutores sobre o ponto que mais o impressionou na leitura de Os Sertões, também não conseguiu esconder sua emoção ao falar sobre a queda da igreja em Canudos. Gente séria participando de evento sério... Tudo isso para mim significou que quem estava lá, estava envolvido pelo sentimento patriótico que se entrelaça, constantemente, com as ações de Euclides da Cunha quer em suas obras, quer em suas atitudes, durante toda sua biografia. É claro que houve exceções em Cantagalo, mas não fizeram diferença; foram rigorosamente a minoria e não atingiram a extraordinária organização que realizou o projeto.

O “Seminário Internacional 100 anos sem Euclides” foi apaixonadamente organizado pela Anabelle e seu marido Luiz Fernando que correram durante os três dias para dar conta do recado e suavizar pequenos problemas que sempre ocorrem à última hora. Foram auxiliados pelo pessoal do GEAC – Grupo Euclidiano de Atividades Culturais para o suporte logístico que cooperou para a excelência do projeto.

Como em todo lugar, a dificuldade é conseguir verbas. Nem sempre a atividade cultural é levada a sério pelas autoridades políticas de qualquer ponto do país. Como compensação a esses tropeços, sobraram o dinamismo, a serenidade, a disposição, o idealismo tanto de Anabelle como de Luiz Fernando para fazer frente a todos os problemas que precederam o início do Projeto. Notei em tudo uma disposição férrea de divulgar o que o Brasil tem de melhor: o pensamento euclidiano. Saí de lá cobrando dos dois professores a organização do próximo Seminário. Cantagalo assume liderança no movimento euclidiano que deve ser mantida.

O que tem me chamado a atenção é a quantidade de movimentos nacionais que se preocupam com a divulgação do pensamento euclidiano. O centenário de sua morte é o pretexto para que intelectuais se manifestem. Essa confirmação deixou-me curiosamente satisfeito e tranqüilo. Acho que independente de tudo, o euclidianismo vai crescer, se firmar em pontos diferentes do Brasil, ter o mesmo caráter nacional de “Os Sertões”. Vários professores ilustres que estiveram em Cantagalo vinham de um Ciclo de Cinema realizado em Salvador, na Bahia, em homenagem aos cem anos da morte de Euclides da Cunha e no dia seguinte, ao término do Seminário em Cantagalo, participariam de outra comemoração do centenário da morte do autor de “Os Sertões” na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Alguns desses intelectuais, convidados à última hora, estavam em São José do Rio Pardo, completando a programação iniciada pela Marly Tercioty, e, possivelmente completada depois de sua saída. Pensei que a programação da segunda versão da Semana Euclidiana já estivesse fechada há mais tempo.

*do Instituto Oswaldo Galotti

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