"AS CATAS" (Euclides da Cunha)
Aonde, deslumbrantes,
Da Indústria e da Ciência as triunfais
Vozes se erguem em mágico concerto;
Eu, não; eu prefiro antes
As catas desoladoras do deserto,
Cheias de sombra, de silêncio e paz...
Eu sei que à alma moderna _ alta e feliz,
E grande, e iluminada,
Não pode sofrear estes febris
Assomos curiosos que a endoidecem
De ir ver, emocionada,
Os milagres da Indústria em Gand ou Essen,
E a apoteose do século _ em Paris!
Não invejo, porém, os que se vão
Buscando, mar em fora,
De outras terras a esplêndida visão...
Fazem-me mal as multidões ruidosas
E eu procuro, nesta hora,
Cidades que se ocultam majestosas
Na tristeza solene do sertão.
Cidades ante as quais são como anãs
As Londres, extensíssimas
E as Babilônias, Bagdás pagãs;
Tão colossais, tão cheias de grandeza,
Nas construções amplíssimas,
Que as contemplando eu penso na rudeza
De uma raça já morta de titãs.
E abandonadas... no entretanto, quem
As observa, no extremo
Dos horizontes afastados, tem
O religioso espanto e o extraordinário
Êxtase supremo
De um muçulmano austero ou de um templário
Diante de Meca ou de Jerusalém.
Divisa então soberbos coliseus,
Templos de forma rara _
Amplas mesquitas, vastos mausoléus,
E góticas igrejas tão imensas
E tão frágeis que para
Compreendê-las, cremo-las suspensas
Por ignota atração vinda dos céus.
No entanto, atulmutuaram multidões
Dentro delas outrora;
E ao ritmo de esplêndidas canções
Levantou-lhes os muros triunfantes
Heróica e sonhadora,
A coorte febril dos Bandeirantes,
Nas marchas triunfais pelos sertões.
Mas passaram _ e o sol que tremeu
A seus passos, deserto,
Revolto e infinito, e como um mausoléu
Imenso que pelo sertão se estende...
Calcando-o, sentis perto,
Um deslizar sinistro de duende:
O fantasma de um povo que morreu.
Viajantes que rápidos passais
Pelas serras de Minas,
Vindos de fulgurantes capitais,
Evitai as necrópoles sagradas,
Passai longe das ruínas,
Passai longe das Catas desoladas
Cheias de sombra, de tristeza e paz...
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