segunda-feira, 30 de julho de 2012

Escolas fazem trabalho sobre Euclides da Cunha




Escolas fazem trabalhos sobre Euclides da Cunha
Carolina Bessa


          As escolas da Rede Municipal do Rio não deixaram passar em branco o centenário de morte de Euclides da Cunha. Elas realizaram projetos para dar mais visibilidade à vida e à obra do autor de Os sertões. As atividades desenvolvidas com os alunos procuraram se adaptar ao nível de ensino deles e variaram também conforme a criatividade e a integração da comunidade escolar.
          Por levar o nome do escritor, a Escola Municipal Euclides da Cunha, em Guaratiba, aproveitou para fazer uma série de atividades e eventos comemorativos. O projeto intitulado Euclides da Cunha: um escritor, uma escola e muitos personagens começou a ser idealizado no início ano, mas foi no segundo semestre que as atividades realmente aconteceram. Segundo a coordenadora pedagógica Cláudia Beatriz, o objetivo foi fazer um trabalho interdisciplinar em que os professores atuassem juntos no desenvolvimento da proposta.
           Para dar visibilidade ao projeto, foi criado um blog (http://emeuclidesdacunha.blogspot.com). Entre os trabalhos realizados estão a confecção de histórias em quadrinhos com alunos de uma turma de 8º ano, orientados pelos professores de Artes, Marcelo Fernando da Silva, e de Matemática, Vanderlan da Silva Ramos. Já a professora de Português Arlene da Fonseca auxiliou na construção de maquetes sobre o Arraial de Canudos com uma turma de 6º ano. A professora de Educação Física Luciete Queiroz não ficou de fora: ela aproveitou o Dia do Folclore, em agosto, para falar um pouco da cultura do Nordeste e confeccionou com os estudantes esculturas de barro, inspiradas na obra de Mestre Vitalino.
            As homenagens pelos 100 anos de morte de Euclides da Cunha não param por aí. Foi realizada uma exposição com fotografias da escola, desenvolvida pelas professoras de História, Shirley Brito, e de Espanhol, Vânia Tosani. No dia 10 de novembro, foi a vez da palestra com o escritor Marcelo Biar, autor do livro Antônio Conselheiro: nem santo, nem pecador. Ele falou da importância histórica do líder do Arraial de Canudos para o sertão nordestino e de sua atuação na Guerra de Canudos. A cobertura desse conflito deu notoriedade a Euclides da Cunha, que, por conta disso, escreveu a obra-prima Os sertões.
           A escola fechou com chaves de ouro suas atividades em dezembro, com exposição dos trabalhos sobre a temática e, ainda, uma apresentação especial da Escola de Samba Em cima da Hora, que desfilou no carnaval carioca em 1976 com o samba-enredo Os sertões, que conta a história de Canudos sob a ótica de Euclides da Cunha.

Café literário

          Na Escola Municipal  José Emygdio de Oliveira,  em Oswaldo Cruz, a professora da sala de leitura, Lilian Mello, realizou um café literário sobre Euclides da Cunha com cerca de 20 alunos do 8º e 9º anos.
         Durante o lanche, eles assistiram ao DVD Arte da TV Escola, que aborda as transformações sociais da passagem da monarquia para a república e a Guerra de Canudos.
          Em seguida, foi feita uma leitura coletiva da adaptação de Os sertões, de José Louzeiro, livro distribuído pela Secretaria Municipal de Educação às escolas. A professora complementou o trabalho com a leitura da biografia de Euclides da Cunha e montou uma apostila como fonte de pesquisa para os estudantes.
         A professora Lilian também estendeu o café literário à outra unidade em que atua, a Escola Municipal Barão da Taquara, em Jacarepaguá. Entretanto, as atividades foram diferenciadas. Ela teve a parceria da professora de História Carla Abreu Barroso, que fez uma monografia de pós-graduação sobre o escritor fluminense e também atuou na Casa de Cultura Euclides da Cunha, de São José do Rio Pardo (SP).        
         Enquanto tomavam chocolate quente, os estudantes assistiram à palestra da professora Carla e fizeram uma leitura coletiva da adaptação de Os sertões. Em seguida, foi realizada uma oficina de redação sobre o tema.

Retratos do sertão

        No Ciep Pablo Neruda, também em Jacarepaguá, a professora da sala de leitura, Clarice Maria Silva, realizou atividades com os alunos do 1º ao 5º anos do Ensino Fundamental. Ela leu trechos do livro mais famoso de Euclides, contou a vida do autor e fez um contraponto com o livro Seca, de André Neves, uma publicação voltada para crianças com imagens que mostram, de forma poética, a força do imaginário infantil contra a dura realidade da seca no sertão nordestino.
        Depois de apresentados ao universo euclidiano, os estudantes fizeram pôsteres sobre o que aprenderam. “As crianças usaram cores fortes para retratar a seca, como vermelho e amarelo. Outras optaram por retratar os últimos sobreviventes da Guerra de Canudos. Elas ficaram muito impressionadas, porque, no grupo de quatro pessoas, havia uma criança. Para expor os trabalhos, fizemos um mural decorativo com juta”, afirmou Clarice. A tarefa envolveu tanto a comunidade escolar que o professor   Anderson Monteiro também resolveu dar sua contribuição e  fez a ilustração de um sertanejo.
         Para a professora da sala de leitura, o projeto atingiu seus objetivos, já que os alunos conseguiram identificar o cenário da história retratada por Euclides da Cunha e aprenderam mais sobre a dura realidade da seca do Nordeste.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Tenda das artes: uma iniciativa do Ponto de Cultura “Os Serões do Seu Euclides"

.




No sábado (14-07), na Praça Cônego Crescêncio Lanciotti, aconteceu a primeira atividade da Tenda das Artes. O evento, produzido pelo Ponto de Cultura “Os Serões do Seu Euclides”, recebeu apoio da Secretaria Municipal de Educação e da escritora Fabiana Corrêa, autora do livro Era uma vez, Euclydes (2009). 


Reunido em um dos pontos principais da cidade de Cantagalo, o grupo, composto por bolsistas e pesquisadores do projeto Arquivo de Memória Amélia Tomás, promoveu um encontro entre infância e arte. As crianças, sentadas em grupo, na tenda montada em frente à Paróquia do Santíssimo Sacramento, tiveram a chance de participar da contação de histórias e, ao mesmo tempo, desenhar e pintar. 


alt

Antonio Conselheiro (a Guerra de Canudos) por Edu Lobo

.

Confira a música 'Antonio Conselheiro (a Guerra de Canudos)' de Edu Lobo.


Iambupe, Bom Conselho 


Jacobina, Xorroxó 

Monte Santo, Mundo Novo 

Lagoinha, Quixadá 

Entre Rios, Belos Montes 

Quem é esse que vagueia? 

Conselheiro que tonteia 

E apeia sem chegar 

Que horizonte mais errante 

Que crendice mais descrente 

Que descrença mais distante 

Que distância mais presente 

Que distância mais presente 

Desgoverno governante 

Quanta gente confiante 

Em Antônio penitente 

Quando o céu virasse a terra 

Como um rio sem nascente 

Quando a espada entrar na pedra 

Quando o mar virar afluente 

Que paixão insatisfeita 

Que vingança mais demente 

Virgem Santa decaída 

Satanás onipotente

Os Sertões é uma obra matricial para pensarmos a cultura brasileira


“De acordo com alguns intérpretes, Euclides da Cunha talvez tenha escrito Os Sertões de trás para frente”, conta o historiador Marçal Paredes

In: http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3010&secao=318


Por: Graziela Wolfart e Greyce Vargas

Doutor em História, Marçal de Menezes Paredes nos concedeu a entrevista a seguir sobre Euclides da Cunha, dando continuidade ao debate feito na revista IHU On-Line da semana passada. “O paradoxo de Euclides da Cunha reside justamente naquilo que ele consegue manifestar – através da utilização dos oximoros – apesar do que os pressupostos da ciência do século XIX permitiam ver. Ou seja, Euclides trabalha com a ambigüidade entre os conceitos do “sujeito” (da ciência, do ponto de vista abstrato) e as características de seu ‘objeto’”, escreveu ele na entrevista que nos concedeu por e-mail.

Marçal de Menezes Paredes é graduado em Ciências Sociais pela PUC-RS, onde também fez o mestrado em História. Na Universidade de Coimbra (Portugal), realizou o doutorado em História. Atualmente, é professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Também é professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUC-RS. É autor de Um Ser (tão) brasileiro: Tempo, História e Memória em Os Sertões de E. da Cunha (Curitiba: Juruá, 2002).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que caracteriza a visão de Euclides da Cunha da identidade brasileira?

Marçal de Menezes Paredes – A interpretação que Euclides da Cunha faz da Identidade Brasileira tornou-se verdadeiramente um clássico e, como tal, sofreu (e sofre) múltiplas interpretações. Obviamente, a cada nova interpretação, novas características de sua obre são posta em evidência. Em minha opinião, em Os Sertões, Euclides funda uma compressão da Identidade brasileira a partir da oposição entre Litoral e Interior. Para ele, dois tipos de mestiços havia no país: o do litoral, que vivia sob uma “civilização de empréstimo” e, outro, do interior, que mesmo se afastando dos parâmetros tomados como certos pelo eurocentrismo científico do final do século XIX, apresentava o que mais faltava aos brasileiros do litoral: vínculo à terra. O sertanejo torna-se “antes de tudo, um forte”, como diz Euclides, por estar harmonizado com o sertão, por defendê-lo na luta e não abandoná-lo na seca. Deste modo, além da oposição entre litoral e interior, Euclides também manifesta os problemas de interpretar o Brasil profundo a partir das lentes etnocêntricas do cientificismo de sua época. Euclides percebeu este problema, que de alguma forma, ainda é o nosso problema: fundar uma hermenêutica histórica da cultura brasileira.

IHU On-Line – Quais os principais pontos da releitura que o senhor faz da obra Os Sertões, sob o viés da formação das identidades nacionais?

Marçal de Menezes Paredes – De acordo com alguns intérpretes, Euclides talvez tenha escrito os Sertões de trás para frente. Explico. Na releitura que faço da obra, percebo grande eco dos escritos do seu Diário (publicado pela Cia das Letras, sob organização de Walnice Nogueira Galvão) na terceira parte do livro, A Luta. Por isso, acredito que a primeira parte e segunda – A Terra e o Homem – são ensaios que buscavam compreender – através dos parâmetros do Determinismo Geográfico e do Determinismo Biológico – “o fato” da Guerra de Canudos. Nestas partes, o autor se utiliza de grande manancial de conhecimentos que vão da Geologia e da Botânica à Etnologia e Sociologia. Na terceira parte, por sua vez, ainda está vibrando o jornalista (Euclides foi para o sertão como enviado especial do Jornal A Província de S. Paulo), mas este vem mesclado com o historiador da batalha. Como se vê, concordo com Guilhermino César quando ele diz que Os Sertões é um “livro-estuário”, pois para lá correram águas de diversos rios (as diversas disciplinas) e o autor soube com maestria aglutinar esteticamente a contribuição de tão variados conhecimentos. É neste ponto que entra sua riqueza estilística e literária.

IHU On-Line – Em que sentido esta obra de Euclides da Cunha pode ser entendida como uma resposta à questão sobre quem é o brasileiro?

Marçal de Menezes Paredes – Em sentido total. Pela lógica de Os Sertões, o sertão é o cerne do interior do Brasil e o interior do Brasil é a essência da nação. O responsável pela tradução do livro para o alemão, o professor Bertold Zilly, explica isso muito bem. Quando Euclides fala do jagunço ele está falando, de alguma forma, de todos os habitantes do interior, dos lugares mais recônditos e inóspitos. Euclides traz ao de cima, à “consciência nacional” a importância de se pensar naquela “terra ignota” (aliás, título de um livro excelente de Luiz Costa Lima , Terra Ignota. A Construção de "Os Sertões". Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira, 1997). Aliás, este o sumo do discurso que Silvio Romero fez para recepcionar Euclides da Cunha na Academia Brasileira de Letras: o ingresso nas letras e na consciência nacional da problemática do povo do interior brasileiro.

IHU On-Line – Onde reside o paradoxo de Euclides da Cunha em relação à questão da identidade nacional em Os Sertões?

Marçal de Menezes Paredes – O paradoxo de Euclides da Cunha reside justamente naquilo que ele consegue manifestar – através da utilização dos oximoros – apesar do que os pressupostos da ciência do século XIX permitiam ver. Ou seja, Euclides trabalha com a ambigüidade entre os conceitos do “sujeito” (da ciência, do ponto de vista abstrato) e as características de seu “objeto”. É fato que o brasileiro nunca se ajustou aos enquadramentos civilizacionais difundidos pela Europa. Mais evidente ainda é que sempre tivemos gerações de intelectuais e políticos tentando brincar de Dr. Jeckyl e Mr. Hyde, “saneando”, “civilizando”, “branqueando” a nação. Em suma, transformando o país num pseudo-laboratório sociológico, tentando mudar a cara do povão para que ela ficasse mais “nos conformes”, nos preceitos ditos corretos. Preceito difundidos por uma Ciência que se dizia “universal” mas que na verdade era profundamente “local” (uma espécie de regionalismo europeu), e, assim sendo, era severamente etnocêntrica. Euclides chega no limite dessa discussão: ele afirma que o sertanejo é “desgracioso, desengonçado e torto” mas também diz que ele representa a “rocha viva da nossa nacionalidade”. Daí a riqueza do oximoro “Hercules-Quasímodo”, que expõe esta tensão e não a “resolve”. E por quê? Por que ela deve ser solucionada, como se de uma equação se tratasse. Deve ser refletida. Pensada. E isso a leitura de Os Sertões propicia. Se pensarmos bem, quando Euclides fala que o sertanejo tem um misto de Herói Grego com o Corcunda de Notre-Dame ele está quase no ponto de reconhecer que não interessa esperar encontrar a Grécia Clássica (como faziam os parnasianos) quando se olha para o povo brasileiro; interessa, sim, reconhecer este povo, respeitá-lo e vinculá-lo a uma imagem positiva da nação. Embora este passo só será dado pelo elogio do Aleijadinho, feita pelo Modernismo (por Mário de Andrade, por exemplo) é importante deixar manifesto que Euclides da Cunha já aponta nesse sentido, embora de forma ainda tensional e ambígua.

IHU On-Line – Como aparecem na obra de Euclides da Cunha os conceitos de identidade, memória e tempo?

Marçal de Menezes Paredes – O conceito de identidade aparece de forma ambígua, como tentei demonstrar mencionando a importância dos oximoros, sobretudo o Hérculos-Quasímodo. Os conceitos de Memória e Tempo ficarão articulados e de alguma forma imbricam-se, embora sejam distintos. Como não podia deixar de ser, Euclides é um homem do seu tempo e é nesse sentido que se deve entender a famosa referência que ele faz sobre a “força motriz da história”. Esta idéia remete à uma percepção universalista, racionalista, teleológica e ontologizada do tempo histórico. Remete à tradição iluminista, à crença da época que dizia que a História tinha um “H” maiúsculo, tinha um rumo único, etapas de desenvolvimento bem estabelecidas e universais (as mesmas para todas as sociedades). Diz respeito, portanto, àquelas compreensões que o próprio Euclides tinha, antes viajar ao sertão, sobre a Guerra de Canudos. Dizia ele que Canudos era um movimento análogo à Revolta da Vendéia, movimento monárquico contrário à República proclamada na França em 1879. Euclides faz um paralelo entre os anti-republicanos franceses – les chuan – e os jagunços liderados pelo Conselheiro. Claro que esta aproximação é ilusória, mas ela revela a maneira como se pensava a República no Brasil e a própria História da Humanidade. Euclides acreditava que se a França teve que passar pela estágio de uma revolta anti-republicana também o Brasil teria de passar pela mesma experiência histórica. Esta idéia alimentou a construção ideológica do movimento de Canudos com sendo o principal obstáculo à evolução civilizacional brasileira, que na época era sinônimo de República. Passada a Guerra e depois de sua experiência no front de batalha, Euclides revê essa noção e faz, n’Os Sertões, um verdadeiro mea culpa republicano. O conceito de memória, por sua vez, se relaciona à produção da memória social deste conflito, onde Euclides tem papel importante, até porque seu livro se tornou uma referência obrigatória no assunto (embora não a única, nem naquele contexto).

IHU On-Line – Como Euclides da Cunha evidencia que as dualidades tradição/modernidade e objetividade/subjetividade não estão dissociadas na construção do discurso acerca da nacionalidade brasileira?

Marçal de Menezes Paredes – A relação entre tradição/modernidade e objetividade/subjetividade aparecem em dois planos: o individual e o coletivo. Ou seja, o do intelectual, do autor, e o do discurso sobre a Identidade Nacional. No primeiro, o individual, é fundamental perceber que Euclides muda seu posicionamento político em relação à Guerra de Canudos conforme ele vai se aproximando do local da Batalha, conforme ele vai conhecendo de perto o sertanejo e o sertão. Seu espanto pela força indômita do jagunço, pela beleza do sertão em época de chuvas, pela diferença radical entre aquelas paragens e o “centro” do país vai alterando gradualmente suas certezas tomadas de acordo com as teorias aprendidas desde os anos de formação militar. A subjetividade do homem Euclides, então, interfere profundamente na certeza do intelectual que era. Lá pelas tantas, no meio do caminho entre Salvador e Monte Santo, Euclides se ajoelha e reza junto com os sertanejos, num povoado simples, ao lado dos sertanejos, prenhes daquela religiosidade simples e sincrética que lhe é própria. E lembre-se que Euclides era um republicano fervoroso, militar positivista e, obviamente, anticlerical. Mas a proximidade, a influência da ambiência social que ele experimentou indo para profundo Brasil fazem-no relativizar isso. E é aí, na minha opinião que começa a aparecer a força dos oximoros que ele utiliza: Tróia de Taipa (Canudos), Hércules-Quasímodo (o sertanejo). No outro plano, o relativo à construção da identidade nacional, deve-se voltar ao oximoro novamente, mas para observar a tensão entre a Ciência e sua proclamada “objetividade”. Como já disse, Euclides desnuda os limites dessa “objetividade” universal, e, portanto, do próprio conteúdo emancipatório da ciência, Quando ele afirma que a “campanha de Canudos foi um crime. Denuncie-mo-lo”, como o faz na Nota Preliminar do livro, ele está apontando para um problema epistemológico sério que só depois da Segunda Guerra Mundial o Ocidente começou a encarar. Afinal, o genocídio de Canudos foi feita em nome do Progresso Nacional, contra “rebeldes monárquicos” inventados, onde os liderados pelo Conselheiro tiveram apenas o papel de bucha de canhão, pois foram “construídos” na mídia da época, como os inimigos do país. Euclides faz um mea culpa republicano em seu livro.

IHU On-Line – Como a proximidade com o sertão modificou a compreensão de Euclides da Cunha do sertanejo e da nacionalidade brasileira?

Marçal de Menezes Paredes – A proximidade foi o grande motivo da mudança de opinião de Euclides da Cunha. Depois de ver que aquele jagunço era forte, honrado, bom de briga e, sobretudo, um tipo brasileiro que estava muito adaptado à região, Euclides modifica sua opinião sobre ele. Passa de uma condenação sumária a um elogio (embora às vezes ambíguo). O sertão fez com que a certeza dele sofresse um processo de descentramento radical e é esse descentramento que cauciona a relativização daquela anterior condenação do jagunço. De inimigo público numero 1 ele passa a “rocha viva da nacionalidade”. Portanto, a viagem à Monte Santo foi importantíssima nesse processo.

IHU On-Line – Como entender a admiração de Euclides da Cunha pelo jagunço?

Marçal de Menezes Paredes – A admiração dele pelo jagunço se alimenta do fato de ele enxergar no sertanejo aquilo que mais faltava aos brasileiros urbanos, do centro do país: amor a terra, apego ao seu quinhão de origem, bravura na luta, harmonia social.

IHU On-Line – Pode explicar a forma como Euclides da Cunha focaliza a construção de discursos sobre a memória coletiva e qual é a sua relação com as identidades nacionais para recolocar a questão sobre quem é o brasileiro?

Marçal de Menezes Paredes – A questão as identidades nacionais é bastante complexa e mereceria maior espaço para um adequado desenvolvimento. Contudo, quero destacar uma coisa: mesmo sendo um verdadeiro obcecado pela forma literária – ele mexeu e alterou incessantemente no estilo de todas as reedições que o livro teve enquanto esteve vivo – Euclides teve muito respeito com os cadernos de notas dos jagunços, que os soldados do exército coletaram depois da queda de Canudos. Notas escritas com erros gramaticais e ortográficos grandes, mas Euclides os transcreve na íntegra, deixando manifesto com a grafia dos jagunços as profecias de Antonio Conselheiro. Acho que isso dá um bom exemplo da honestidade intelectual do autor de Os Sertões e, em ultima análise, mostra um respeito grande pela memória coletiva dos sertanejos. No limite isso lembra um pedaço do Manifesto Pau Brasil, publicado 26 anos depois por Oswald de Andrade : “A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos”. Falar de memória coletiva e identidade nacional, da definição sobre quem é o brasileiro pressupõe que aceitemos o artesanato lingüístico-popular que temos nas ruas, em cada esquina do Brasil. Euclides coleta isso lá no sertão. Depois dele, Guimarães Rosa reinventará isso e de maneira absolutamente brilhante.

IHU On-Line – Quais os principais dilemas que envolvem a formação histórica do Brasil e em que sentido Euclides da Cunha contribuiu para esse debate?

Marçal de Menezes Paredes – Em minha opinião, o principal dilema que temos, ainda hoje, para pensarmos a formação histórica da cultura brasileira diz respeito aos critérios a serem utilizados. Como pensar o Brasil como nossos critérios? Como olhar para nós mesmos despidos de preconceitos que fizeram parte da nossa própria formação? Este ainda é o nosso desafio e este também era o desafio de Euclides (e ele estava consciente disso, creio). Por isso, usa o oximoro, como tentei atrás explicar. Sua contribuição é, portanto, fundamental. Os Sertões é uma obra matricial para pensarmos a cultura brasileira porque ela inaugura a percepção desta tensão epistemológica e cultural ao mesmo tempo.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Cantagalense lança livro infantil

       Fabiana Corrêa, professora do Colégio Euclides da Cunha, em Cantagalo, e participante ativa do movimento euclidiano da cidade, acaba de lançar um novo livro: "História de um Cambucazinho", pela editora Nitpress.

         O livro traz um história ambientada na Reserva Biológica dos Cambucás, localizada no município de Cantagalo. Segundo Fabiana, a ideia de ambientar a história do livro na Reserva serviu para chamar atenção do leitor para os problemas ambientais do local, tais como a redução da área da reserva, a extinção de espécies nativas, a ação predatória dos caçadores e o risco iminente da formação de desertos verdes naquela região.


          O Colégio Euclides da Cunha desenvolve, desde 2001, o Projeto Cambucás. Alguns dos alunos que participam do projeto são personagens dos livros e interagem com animais e árvores da região. A ideia inicial surgiu em 2008, mas sob o formato de teatro, e só a partir de 2010 foi retomada como livro infantil. 


         O processo de criação dos desenhos das personagens ficou a cargo de Arthur Consídera Abreu, que, sob a orientação de Fabiana Corrêa, organizou as ilustrações a partir das características e das cenas mais expressivas. 


        Além disso, a obra é acompanhada de um álbum de figurinhas (que são autocolantes e vêm encartadas no próprio livro). Para completar o álbum, a criança precisa ter atenção às características dos personagens apresentadas ao longo da história, além de permitir que tenham uma série de informações quanto ao nome científico e algumas particularidades das espécies em questão. Sendo assim, segundo a própria autora, a “História de um Cambucazinho” é um livro para divertir, mas também para instruir.


       No dia 30/06, o livro foi lançado no III Salão da Leitura de Niterói, às 17h, acompanhado de uma oficina de contação de histórias.